
O final de tarde não estava convidativo a passear na praia sem um agasalho, por isso, não me atrevi a sair sequer do carro.
O tempo taciturno, algo sombrio até para a hora do dia, muito ventoso, o mar demasiado revolto.
Uma espécie de manto branco cobria a areia de espuma branco coral.
A praia praticamente deserta.
Detive a atenção, na única pessoa que se encontrava descalça, na areia a tentar manobrar um papagaio de papel acoitado pelo vento.
Lutava contra ao vento, determinado a mantê-lo no ar. Ora desenrolando o cordel, puxando em determinada direcção de forma a corrigir a rota, movendo-se mais ele próprio, no chão, do que o próprio papagaio que continuava mais acoitado pela ventania que controlado pelo suposto "manobrador".
E não pude deixar de pensar, quantas vezes nós não somos uns manobradores desajeitados do nosso papagaio.
Lutamos contra circunstâncias, obstáculos, medos que receamos tanto a admiti-los quanto mais encará-los, defendemos dogmas adquiridos, escondemos sentimentos, quebramos valores, temos um chorrilho de convenções e ideias feitas e pré-estabelecidas, das coisas que não são mais do que ventos ou até tempestades, que dificultam ou até inutilizam a boa manobra de quem teima em assumir o comando do "papagaio".
Continuamos com a certezas que somos nós que ditamos as regras, que manobramos o "papagaio".
Estamos constantemente entretidos a corrigir rotas, ao sabor do vento, puxamos um cordel daqui, resenrolamos mais um pouco de cordel acolá, recuamos, avançamos, permanecendo convictos que estamos a comandar com muita mestria o "papagaio".
Se a minha vida é o "papagaio " e eu o "manobrador" , quando as manobras são mais determinadas pelos "ventos" do que pelos comandos e cordéis de que disponho.
Quando o "papagaio" teima em seguir ao favor do vento....a culpa só pode ser do manobrador que se recusa a amainar ventos e teima em recusar as brisas.
Recusamos tantas e tantas vezes a brisa e andamos ininterruptamente ao sabor da tempestade.
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